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Foto do escritorPitacos

Da cobertura de tragédias ambientais ao livro-reportagem: uma conversa com Cristina Serra

Por Júlia Mendes


“Seja uma encosta que desaba e mata famílias, seja uma barragem que entrou em colapso, seja a floresta que pega fogo. As coisas não acontecem por acaso. A cobertura sobre as causas dessas mazelas não pode parar. Essa é uma coisa que o jornalismo brasileiro precisa refletir e observar.” É o que diz a jornalista Cristina Serra quando perguntada sobre o papel do jornalismo na cobertura de grandes tragédias ambientais, como a recém-ocorrida em Petrópolis. Cristina foi entrevistada pelas alunas Mylena Larrubia e Gabrielle Oliveira na 12ª edição da quarta temporada do ECOnversa, projeto do Laboratório 1 de Jornalismo da UFRJ.


Ex-repórter da TV Globo e autora do livro “Tragédia em Mariana: a história do maior desastre ambiental do Brasil”, Cristina diz que, na sua visão, o jornalismo brasileiro é muito focado na cobertura factual das tragédias e pouco voltado para a explicação das causas destes problemas. Para ela, apesar de muitos jornalistas já fazerem esse tipo de cobertura, essa preocupação deveria estar presente com mais frequência na grande imprensa. “O nosso trabalho é esse. Claro que é importante mostrar o que está acontecendo lá nesse momento, o desespero das famílias tentando achar seus parentes que estão desaparecidos e os bombeiros. Mas, sobretudo, é importante mostrar esse aspecto que eu mencionei [cobertura das causas]. Não é a chuva que castiga. Por que aquelas pessoas estão ali? Por que a verba não foi aplicada? E cobrar isso das autoridades.”


Na live do ECOnversa, realizada no dia 22 de fevereiro, Cristina foi perguntada sobre diversos aspectos da sua trajetória como jornalista e, mais tarde, escritora. Sobre essa mudança na carreira, ela explica que, enquanto o jornalismo é um “trabalho do momento” com muita correria para produzir material, o livro-reportagem demanda uma contextualização maior na história, tendo que explicar melhor o assunto e mergulhar nele. Enviada como repórter especial do Fantástico para cobrir a catástrofe de Mariana em 2015, Cristina relata que sentiu uma certa limitação na apuração dos fatos durante a cobertura da tragédia e uma necessidade de mais tempo para entender as raízes do problema. E foi assim que decidiu deixar o cargo de jornalista na TV Globo para se dedicar ao livro. Segundo ela, quando percebeu que o impacto era tão gigantesco, viu que não cabia somente na cobertura semanal. “Eu tenho que escrever esse livro. Eu tenho que escrever, porque a história dessas pessoas tem que ser contada. Essa história tem que ser contada para que não se repita. Mas infelizmente em 2019 aconteceu Brumadinho e pra mim foi extremamente frustrante porque eu vi que a sociedade brasileira não aprendeu com Mariana. Teve que acontecer Brumadinho para a gente refletir mais sobre esse impacto da mineração no Brasil. Mas foi assim que esse livro nasceu”, esclarece.


Por fazer coberturas de tragédias ambientais desde o início de sua carreira, Cristina foi perguntada sobre a relação entre a sensibilidade do repórter e o dever de noticiar nesses momentos de dor e tensão das vítimas envolvidas. Para ela, essa é uma discussão importante. O profissional tem de estudar o ambiente e perceber se é possível ou não abordar a pessoa. Além disso, segundo ela, o jornalista não é uma espécie de robô sem emoções. Em muitos casos é extremamente difícil para o repórter segurar a emoção, assim como foi com ela em Mariana. Por isso, o lado da sensibilidade é um grande desafio para o jornalismo. “Essa é uma das coisas mais difíceis da vida do repórter. Essa tragédia coletiva é, na verdade, várias tragédias individuais. Cada pessoa que morreu em uma família é uma tragédia. Isso requer do jornalista uma sensibilidade imensa.”


Cristina também é autora do livro “A Mata Atlântica e o Mico-Leão-Dourado: uma história de conservação” e conta que foi muito gratificante para ela, como jornalista, poder falar sobre como é possível unir preservação ambiental com desenvolvimento econômico. Isso porque, diferente do primeiro livro, essa é uma história de sucesso sobre a luta que salvou o mico-leão-dourado da extinção. “Foi muito bom escrever esse livro porque quase todas as vezes que falamos sobre meio ambiente é sobre problemas. Falar de meio ambiente é falar de forças econômicas em conflito, então é problema na certa. Mas dessa vez foi diferente.”


Decidida a ingressar, de fato, na cobertura ambiental após os livros, Cristina conta que recebeu algumas propostas para continuar na área política, mas o que queria mesmo era a cobertura ambiental. “E eu dizia que não queria cobrir política. Eu queria meio ambiente, porque esse tema vai ser o assunto mais importante do mundo daqui a um tempo, por causa das mudanças climáticas. Eu já sabia disso. Eu já estava lendo e me preparando pra isso. Só que aí veio a pandemia e jogou todos os meus planos por terra.”, explica ela. Durante o período pandêmico, foi chamada para integrar a equipe de colunistas da Folha de S. Paulo.


Atualmente, Cristina também é candidata à presidência da ABI (Associação Brasileira de Imprensa) e, se for eleita, será a primeira presidente mulher da associação. Ela explica que decidiu se candidatar porque percebe uma concentração muito forte do jornalismo em algumas áreas do Brasil e que isso precisa mudar. De acordo com ela, o jornalismo é uma profissão de risco e por isso deve-se garantir a segurança dos profissionais da área em todo o Brasil. “Por exemplo, na Amazônia, a situação dos jornalistas é muito mais difícil. A ABI é associação BRASILEIRA de imprensa, então ela precisa ser realmente brasileira. Ela não pode estar restrita ao Sudeste. Ela precisa se expandir tendo associados no Brasil inteiro, para que a gente possa ter mecanismos de segurança para esses profissionais de outras regiões.” Por isso, sua candidatura se baseia na necessidade de ampliar a diversidade na ABI e, claro, defender a democracia.


Não deixe de conferir a entrevista na íntegra: https://www.instagram.com/tv/CaTJOaiJM6e/?utm_source=ig_web_copy_link

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