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Flow Podcast: Politicamente incorreto com uma política correta

Atualizado: 10 de set. de 2021

José Mário Curvo e Ferraz Santos

Foto: Divulgação/Flow Podcast


Funkeiro, bodybuilder, rockeiro, político, imitadora, comediante, rapper, youtuber, atriz de filmes adultos, perito em linguagem corporal, deputado, especialista em aviões e prefeito. Essas são as ocupações de alguns convidados do Flow Podcast, apresentado pelos ex-gamers Igor e Monark. Parece sem critério, né? À primeira vista, sim. Enquanto os produtores audiovisual visam nichar cada vez mais o seu conteúdo, o Flow segue na contramão com uma proposta diferenciada: conversar com diversas personalidades em um tom mais do que descontraído.

Logo nos primeiros minutos das gravações, o ouvinte pode notar várias palavras de baixo calão e até o consumo de drogas ilícitas pelos apresentadores. Para alguns, essas características ultrapassam os limites do politicamente correto. Independente de qualquer posicionamento, é inegável que essas práticas cercam o cotidiano de grande parte da população brasileira, por isso tais ações são majoritariamente irrisórias para a audiência.

Particularmente, acreditamos que o Flow Podcast até pode ser considerado politicamente incorreto dentro dos moldes da comunicação tradicional brasileira. No entanto, dentre todos os veículos informacionais do país, creio que esse programa promove a política mais correta, isto é, proporcionar voz a todos. Igor e Monark não seguem uma linha editorial em suas conversas de bar - como os próprios gostam de caracterizar. Dessa maneira, a sinceridade e a autenticidade dos apresentadores comanda o rumo da gravação, exatamente como os ouvintes desejam. Aliás, quem não gostaria de trocar a famigerada ideia de uma maneira totalmente informal com aquela personalidade que se comunica apenas com falas preparadas pela assessoria?

Imagine você dialogar com todos os candidatos à prefeitura da sua cidade em uma conversa olho no olho, totalmente aberta para debates, questionamentos e sem tempo limite de fala. Nas últimas semanas, o Flow Podcast tem feito isso com todos os concorrentes ao cargo máximo do poder executivo da cidade de São Paulo. Todos os políticos foram convidados para participar do programa e isso é excelente, pois ainda vivemos em uma democracia. Vale ressaltar que nem nos debates televisivos observa-se a presença de todos os candidatos, haja vista que muitas emissoras deixam de convidar políticos com menos de cinco representantes partidários no Congresso Nacional, algo permitido pela Constituição.

Então, apesar das palavras de baixo calão e consumo de drogas - inclusive na frente do prefeito de São Paulo -, os mais conservadores não podem negar que o Flow promove a política correta, isto é, aquela que universaliza a oportunidade da explicação, o que falta em muitos veículos com linhas editoriais bem definidas.

Um exemplo claro dessa chance proporcionada pelo podcast aconteceu há alguns meses com o canal Xbox Mil Grau. Na ocasião, os youtubers foram acusados de racismo devido a uma publicação no Twitter e, logo em seguida, foram divulgados diversos comentários preconceituosos dos donos da página, realizados em lives. Evidentemente, os internautas criticaram muito os produtores de conteúdo, inclusive muitos portais jornalísticos estrangeiros noticiaram os fatos, o que é raro para a internet brasileira. Dentro desse contexto de indignação total, o Flow Podcast anunciou a participação da Xbox Mil Grau em um programa. A conversa teve mais de quatro horas de duração e, evidentemente, Igor e Monark questionaram muito as práticas racistas dos donos da página, exatamente como a maioria da audiência gostaria. Embora a maioria da internet tenha discordado da participação e até ter “cancelado” o podcast, eu particularmente defendo a ação promovida pelo Flow, não só para proporcionar essa chance de explicação aos responsáveis pelas falas racistas, mas também para ver como os convidados se comportam na vida real, sem ser atrás de uma tela. O resultado foi um sucesso de audiência, mas os youtubers não foram capazes de amenizar as críticas da opinião pública, muito pelo contrário.

Justamente, por ter esse poder de influência e garantir voz a todos, o Flow Podcast gera comparações a um programa jornalístico. Esse tema foi levantado durante uma entrevista com o cantor Rogério Skylab, que defendia o caráter jornalístico do programa. No entanto, Igor e Monark discordam totalmente dessa denominação. Os apresentadores fazem questão de deixar claro que aquela gravação é análoga a uma conversa de bar.

Realmente, é injusta essa comparação para o Flow. O podcast propõe algo totalmente diferente do jornalismo. É uma conversa totalmente informal sem qualquer intenção de uma grande repercussão, é basicamente “trocar uma ideia”. E essa pode ser a chave do sucesso do programa. Mas, a comparação também é injusta com o jornalismo. O jornalista sério busca ser imparcial para informar o público por meio de um árduo trabalho de apuração. Qualquer entrevista jornalística demanda um estudo detalhado do convidado e elaboração de pauta. Isso é básico. Monark e Igor admitem abertamente que não pesquisam nada sobre o entrevistado antes da conversa. É simplesmente uma conversa coloquial, o que é totalmente diferente de uma entrevista de qualquer veículo informacional responsável. Na realidade, a comparação não deve ser feita por ser injusta tanto para o Flow Podcast quanto para o jornalismo. No entanto, ambos os meios de comunicação são válidos e cada um tem o seu espaço.

De uma maneira geral, o Flow Podcast é totalmente recomendado para todos os amantes desse novo estilo de conteúdo de áudio. Os ouvintes têm a oportunidade de acompanhar uma conversa informal com diversas pessoas de diferentes perfis, podendo interessar ou não o internauta. Além disso, quem acompanha o programa ao vivo pode enviar perguntas aos entrevistados, mas para isso é necessário desembolsar uma quantia em dinheiro no YouTube ou na Twitch, as duas plataformas de streaming ao vivo do podcast.

Na nossa opinião, é válido escutar os episódios de todos os convidados, mesmo que não acompanhe o ramo do entrevistado ou até discorde dos posicionamentos, principalmente nos programas com os candidatos à prefeitura de São Paulo. É preciso ter humildade para reconhecer as vantagens da pluralidade de ideias, propostas pelo Flow, ainda mais na era do cancelamento virtual. Compartilho aqui a minha experiência pessoal de ter escutado todas as entrevistas dos postulantes à prefeitura da capital paulista, desde Guilherme Boulos até Arthur do Val, dois candidatos de ideais antagônicos e conhecidos na internet. É necessário ouvir todas as ideias para se desvincular de estereótipos, produzidos pelas bolhas políticas virtuais.

Para os estudantes de jornalismo, fica aqui também a minha recomendação. Querendo ou não, o Flow Podcast realiza entrevistas, mesmo que seja em um formato de conversa informal. Embora haja grandes diferenças na preparação e na execução, vale usar o programa como um exemplo de como se comportar durante a entrevista para conseguir render boas declarações do convidado. Desde a linguagem corporal, até a demonstração de atenção na fala do entrevistado e a maneira de abordar um assunto desconfortável. Mesmo que inconscientemente, Igor e Monark demonstram isso e muito mais no Flow Podcast.

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