Dayane Marques
Uma reportagem especial exibida pelo Esporte Espetacular, da Rede Globo, busca mostrar como o futebol e a religião caminham no Brasil e como as manifestações de fé se tornaram tão populares em campo. De autoria do jornalista André Galindo, a reportagem destacou casos de preconceito religioso no meio esportivo e mostrou que o tema ainda é cercado de tabus. A dificuldade já começa em conseguir entrevistas com jogadores, pois alguns clubes proibiram seus atletas de falarem sobre religião e outros só cederam com insistência.
Futebol e Religião (Foto: Esporte Espetacular – TV Globo)
A reportagem, dividida em dois episódios, começa com uma busca nos arquivos da TV Globo para descobrir quando começam as demonstrações religiosas no futebol. Em entrevistas, Garrincha, Zagallo e Pelé não fazem referências a Deus ou a outras manifestações religiosas.
Entrevistado na reportagem, o professor Claude Petrognani, doutor em Antropologia Social pela UFRGS, afirma que entre as décadas de 70 e 80 a população evangélica cresceu. Foi a época em que surgiu o grupo “Atletas de Cristo”, que se tornou um grande sucesso. Jogadores passaram a manifestar sua fé em campo com gestos como o de apontar para o céu, além de usar camisas com frases religiosas e passar a falar mais de Deus. Na reportagem, o ex-piloto Alex Dias Ribeiro relembrou que, por trazer frases de fé em seus carros de corrida, passou a liderar o grupo em 1986. Ele foi convidado por jogadores para estar em várias Copas do Mundo, a primeira em 1990, com o intuito de levar mensagens e pregar a fé cristã entre os atletas que assim desejassem.
Brasil é pentacampeão do mundo (Foto: Acervo O Globo)
A reportagem expõe as rodas de oração feitas pelos jogadores antes dos jogos, quando eles rezam o “Pai nosso”. Depois os grupos se dividem conforme suas religiões para continuarem pedindo por bons resultados nas partidas: católicos rezam “Ave Maria”, evangélicos oram, e jogadores adeptos do candomblé ou da umbanda fazem pedidos aos seus orixás. Nesse momento, as diferentes crenças têm seu espaço e são respeitadas.
Mas nem sempre o respeito é a tônica dessas relações - e é isso que mostra a segunda parte da reportagem.
A sequência aponta que no Brasil as manifestações de cunho religioso são muito mais frequentes e comuns do que no futebol europeu. Segundo o professor Claude, que é italiano, os jogadores europeus têm uma maneira diferente de vivenciar a religião: de forma mais “privada e sentimental”. O lateral do Corinthians Fábio Santos conta que os atletas que vêm da Europa para jogar no Brasil estranham essa relação dos brasileiros com a religião dentro de campo. Ele também conta que já sofreu preconceito por parte de um colega de equipe quando foi questionado de forma irônica a respeito do que seria uma imagem que ele levava para o quarto - e ele teve que explicar que era Santo Expedito, de quem é devoto. O colega pediu desculpas. O jogador Fábio, ex-goleiro do Cruzeiro, contou que já foi questionado por falar de Deus em suas entrevistas; explicou que vive Deus em todos os momentos e por isso não deixa de mencioná-lo.
A reportagem passa a mostrar como religiões minoritárias no Brasil, principalmente de matrizes africanas, sofrem preconceito e como isso afeta os jogadores adeptos delas. Como é o caso de Antonio Feijão, meio-campo do São Bernardo e que é do candomblé. Muitas vezes, ele teve que esconder sua religião e já sofreu com comentários como “Tá fazendo macumba para poder jogar”, “seu macumbeiro”.
Demonstrações como a de Paulinho, atacante da seleção brasileira nas olimpíadas de Tóquio, se tornam um marco na luta contra o preconceito. Ao comemorar um gol contra a Alemanha, o jogador fez o gesto de um arco e flecha, representando um dos símbolos do candomblé e da umbanda. O jogador lembra que a herança do preconceito vem da escravidão, quando os povos africanos escravizados eram proibidos de manifestar sua cultura no Brasil.
Comemoração do gol de Paulinho (Foto: O Globo)
A reportagem destaca outros casos de intolerância, como o de Papa Faye, meio-campo do São Bento-SP que é senegalês e muçulmano. A falta de informação e a ignorância o fizeram ouvir que ele seria terrorista por seguir o Islã. Além dele, Igor Julião, lateral do Vizela-Portugal, não tem religião, mas relata se sentir ofendido quando os colegas de vestiário tentam convencê-lo a se converter.
Os jogadores entrevistados são unânimes em defender que prevaleça o respeito às diferenças acima de tudo, e que cada um possa ser livre para manifestar sua fé e suas crenças sem se sentir desrespeitado ou ofendido. Apesar de serem temas que a sociedade evita discutir, futebol e religião andam juntos no Brasil - algo que deve ser respeitado em suas diversas formas e expressões.
FICHA TÉCNICA
Reportagem: Futebol e Religião: reportagem mostra os caminhos e o preconceito da fé no futebol brasileiro
Sinopse: A reportagem especial do Esporte Espetacular busca mostrar como o futebol e a religião caminham no Brasil e como as manifestações de fé se tornaram tão populares em campo.
Autor: André Gallindo
Como rever: Primeira parte - https://globoplay.globo.com/v/10196140/
Segunda parte - https://globoplay.globo.com/v/10215032/
Comments