Luana Reis
O escândalo do século traz uma coletânea de reportagens do renomado jornalista e escritor colombiano Gabriel García Márquez, publicadas entre 1950 e 1984. O livro é uma amostra do trabalho de décadas de um dos maiores escritores da América Latina, vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 1982. Gabo, como também era conhecido, tinha um jeito único de transformar simples manchetes em narrativas emocionantes e deveria ser a próxima leitura de todo estudante de jornalismo preso em isolamento social sem poder se aventurar pelas notícias que, nesse momento, acontecem mundo afora.
(Capa do livro / Imagem: Reprodução)
Gabriel García Márquez nasceu em março de 1927 em uma pequena cidade colombiana chamada Arataca. Além de escritor e jornalista – profissão descrita por ele como o “melhor ofício do mundo” – ele também foi um intelectual engajado nas questões sociais em torno da realidade da América Latina. Ao longo de mais de quatro décadas de eventos, coberturas e reportagens, Gabo escreveu críticas de cinema, foi correspondente internacional nos Estados Unidos e na Europa e publicou livros que encantaram milhares de pessoas ao redor do mundo, como Cem Anos de Solidão, uma de suas obras mais conhecidas.
Sua maneira de fazer reportagem vai muito além dos tradicionais manuais de redação. É uma leitura que deveria servir de inspiração e ser estudada por todo jornalista que deseja se tornar um verdadeiro contador de histórias. Márquez era capaz de nos fazer enxergar acontecimentos e reflexões que poderiam passar despercebidos por jornalistas treinados somente a seguir as normas tradicionais e fazer a cobertura seca das notícias – provavelmente afastados da essência principal da profissão.
O primeiro capítulo do livro nos traz “O barbeiro presidencial”. Publicado em 1950 no jornal El Heraldo, a reportagem relata a inauguração do serviço telefônico direto entre Bogotá e Medellín sob uma perspectiva que apenas Gabriel García Márquez poderia ter. Quem teria sido o homem de grande confiança responsável por deixar impecável a aparência do presidente da república em um dia tão especial? Ele nos convida a conhecer essa figura que parece ser muito mais importante do que julgamos e nos põe a imaginar o que, naquela manhã, teria se passado na mente do único homem no país com a permissão para deslizar uma navalha no pescoço do presidente todos os dias.
Ao longo do livro, temos a oportunidade de ler outras reportagens como “O equívoco explicável”, na qual um bêbado que caiu da janela vira um verdadeiro protagonista, com direito a personalidade, emoções e uma história de fundo, algo que não estamos acostumados a encontrar nas matérias de jornal. E “Carteiro bate mil vezes”, que nos mostra a capacidade de Gabo de transformar o simples relato de uma casa em Bogotá para onde são levadas as cartas com dados errados que nunca chegam a seu destino em uma crônica muito prazerosa de se ler. Já “S.S. sai de férias”, descreve a viagem habitual do Papa do Vaticano ao Palácio do Castelo Gandolfo como uma aventura emocionante e cheia de suspense. Um jornal recheado de acontecimentos deveria ser um prato cheio de oportunidades para ele, pensamos. No entanto, a dificuldade em encontrar um assunto é justamente o tema principal em “Tema para um Tema”, na qual Márquez procura uma inspiração enquanto percorre pelas manchetes do dia e, ironicamente, ressalta: “Há quem converta a falta de tema em tema para uma crônica jornalística. O recurso é absurdo em um mundo como o nosso”. Esses são alguns exemplos do que você vai encontrar.
A história que dá nome ao livro, O escândalo do século, trata-se de um compilado de reportagens investigativas publicadas por Gabo entre 17 e 30 de setembro de 1955 no El Espectador. Ele buscava respostas para o caso de uma moça que apareceu morta nas areias da praia de Tarvaianica, perto de Roma, investigando e construindo os personagens minuciosamente sob a expectativa de que esse acontecimento teria o potencial para se tornar uma grande novela. A polícia julgava ter sido um acidente, mas a família acreditava se tratar de um assassinato. Porém, para descobrir o desenrolar dessa série de episódios, será preciso mergulhar nas páginas dessa coletânea precisamente escolhida pelo editor espanhol Cristóbal Pêra.
"É uma antologia que nos revela um escritor brincalhão e desinibido, cujo jornalismo pouco se distingue de sua ficção.” É dessa forma que o prólogo apresenta o livro. As palavras são de Jon Lee Anderson, jornalista e amigo de Gabo. Ele nos traz os detalhes e bastidores da vida do escritor e nos prepara para degustar a amostra do seu trabalho que vem em seguida. Vale ressaltar que é imprescindível conhecer a personalidade e a história de Gabriel García Márquez antes de ler a coletânea de reportagens para aproveitar essa experiência ao máximo.
O escândalo do século é o convite perfeito para conhecer o trabalho de Gabriel García Márquez, com histórias de tirar o fôlego. Apesar da maioria dos capítulos ser curta, a melhor parte é saboreada no final, porque Gabo sabe como encerrar um texto da melhor forma possível e sempre nos deixa com vontade de reler. Você vai ficar curioso para tentar desenhar a linha entre literatura e jornalismo em suas histórias. E, com certeza, vai passar o resto do dia pensando naquela ironia ou teor de crítica social na última frase, característico de seu estilo. Definitivamente não pode faltar na estante de um bom jornalista.
Ótimo texto, Luana!!
Texto incríveeel
O texto ficou excelente! Já quero esse livro.
Amei o texto, Lu! Já quero comprar o livro!